Os alicerces do CRD - Controle de Resultado Disponível!

Primeiro a prática, depois as teorias!


Meu primeiro contato com custos e precificação começou muito precoce, em 1998, quando não tinha sequer visto uma aula de contabilidade ou de educação financeira e o meu interesse por cálculo do ponto de equilíbrio, iniciou logo em seguida, em 1999, períodos em que trabalhei em uma mercearia no meu bairro.

O trabalho era de atendente multifunção, daqueles que faz de tudo um pouco: controla estoques, vende, compra, cobra, faz a limpeza geral e no período em que o proprietário esteve afastado devido a problemas de saúde, também tomava todas as decisões do negócio.

A primeira orientação que recebi ao ser contratado foi, verificar o preço de compra das mercadorias nas notas fiscais logo que entrasse na empresa e multiplicar por 1,3 se fossem itens de mercearia, e multiplicar por 1,9 se fossem bebidas e cigarros, afim de etiquetar os preços, armazenar nas prateleiras e atualizar os cartazes de exposição, e a segunda orientação foi preencher a ficha de caixa e a folha de fiados, que era muito comum naquela época.

Não compreendia o porquê daqueles números (margem) e não encontrava uma motivo racional pra explicar os preços praticados. Pra mim era muito claro que o proprietário estava perdendo dinheiro, tendo em vista que alguns itens de mercearia fazia concorrência com os maiores mercados da cidade, e na maioria da vezes estava com preços menores.

Então, apesar da minha quietude, a minha curiosidade sempre foi muito latente, e por isso questionei o proprietário sobre os 'porquês' daqueles preços e aí então eu tive a minha primeira aula de negócios que faz sentido até hoje.

'Seja fiel e recíproco com quem sempre esteve com você. Eles são sua base de sustentação'

Fidelidade e Reciprocidade


No inicio da década de 80 ele havia fundado a Mercearia, um comércio de bairro que atendia um público com pouco poder aquisitivo.

Nessa época ainda não tinha os grandes mercados na cidade, e ele praticava desde então preços baixos e vendia fiado aos que precisassem e em contrapartida os moradores eram fiéis e pontuais ao seu comércio desde a sua fundação.

Havia uma relação de reciprocidade já estabelecida entre a Mercearia e seus clientes e isso trazia uma segurança para o negócio que nunca passou por dificuldades, mesmo nas profundas crises do Brasil entre o inicio da década de 80 e final da década de 90.

Eu fiquei impressionado em como ele conseguia manter o negócio, vendendo a crédito (fiado) em um bairro pobre, com uma margem tão apertada e exígua.

'O relacionamento fiel e recíproco com o cliente é mais importante que o preço.'

Controle e Planejamento


Mas além da fidelidade e reciprocidade de seus clientes, que naquela época deixavam de fazer compras nos mercados maiores e faziam a compra completa do mês na Mercearia, ele tinha outra ferramenta de produtividade – a sua calculadora e seu caderno de anotações.

Todo dia de manhã ele registrava em seu caderno o total das vendas que os atendentes tinha feito na folha de fiados no dia anterior, somando ao saldo total acumulado do mês, fazia a sangria do caixa e atualizava o saldo inicial da ficha de caixa do dia.

No final do mês, ele já tinha programado todo o mês seguinte, colocando os cálculos do caderno; na parte de cima tudo, era o que ele tinha para receber no mês que iria se iniciar.

Na parte de baixo, subtraindo, tudo o que ele tinha que pagar no mês (que era muito pouco, visto que ele não comprava nada a prazo, só a vista e no dinheiro) e com isso ele já sabia o que iria sobrar para ele viver no mês, e já tinha a intuição se ele deveria aumentar os preços, ou aumentar os volumes de vendas, mantendo o preço.

Essas simples ações era tudo o que o proprietário usava para administrar a Mercearia. E ele nunca errou! Quando tinha que aumentar os preços, ele aumentava sem pestanejar e quando era o volume de venda que ele tinha que aumentar, fazia uma oferta inusitada, um torneio de truco ou sinuca e anunciava.

E eu olhava aquilo, e dizia para mim mesmo – olha aí, é assim que as coisas funcionam na prática.

'Se meu caixa diz que eu posso, eu faço. Se ele me diz que eu não posso, eu reajo.'

Decisões rápidas e acertadas


Já em 2011, após alguns anos de carreira como Consultor de Implantação de sistemas ERP nas maiores empresas de tecnologia do Brasil (RM Sistemas e TOTVS), abri minha empresa de consultoria e comecei a trabalhar como Consultor Empresarial , onde além de trabalhar com otimização de sistemas, eu desenvolvo e implanto desde então, um 'Controle Gerencial de Resultados', com modelagem de custos e rentabilidade.

Dentre os diversos segmentos em que atuei, observei que nos bancos os cálculos, apesar de muito mais sofisticados do que os de uma simples adição/subtração, também tomavam decisões pelo resultado de caixa.

No começo de cada ano os bancos já sabiam o quanto poderiam aumentar o seu volume de crédito/ativos até o final desse ano. Isso obrigava os bancos a otimizar as entradas de caixa para cada unidade de crédito contingenciada, daí a famigerada meta que deixam os gerentes carecas antes do tempo.

Ainda em 2011, fui prestador de serviços de consultoria na UNISANTA - Universidade de Santos, onde tive a oportunidade de conhecer e trabalhar com o Sr. João Bacci, Contabilista Emérito e (título concedido em 2002 pelo Sindicato dos Contabilistas de São Paulo - Sindcont-SP) profissional com vasta experiência contábil, especialmente em Controle de Caixa, sendo o autor do livro “O novo SPB – e o Impacto no Fluxo de Caixa das Empresas” em parceria com Clemil Robles.

Neste episódio, em poucas audiências com o Sr. João, entendi um conceito muito importante que desde então aplico em todas as minhas consultorias:

'Os relatórios contábeis só serão úteis aos gestores, se puderem ser usados para tomada de decisões rápidas e assertivas.'

O escopo do trabalho que fiz com o Sr. João foi a otimização do 'Relatório Gerencial de Resultados' que era periodicamente apresentado a diretoria.

O contabilista anterior que prestava assessoria a UNISANTA, havia criado um book de relatório fantástico e ao analisar toda a estrutura, apresentação de indicadores, rateios por centros de custos, margem unitárias, margem liquidas e demonstrações financeiras, era difícil de imaginar uma otimização naquele trabalho, digno de uma das Big Four, feito a 16 mãos.

Mas na minha primeira reunião de alinhamento com o Sr. João, entendi o que precisava ser feito e o porquê - não havia nada errado com o relatório, só que não respondia as questões necessárias para a tomada de decisões.

Em um segmento em que a inadimplência pode ultrapassar o patamar de 40% do total de receitas projetadas não é possível utilizar os métodos tradicionais de controle de custos e rentabilidade para apresentar resultados que norteiam as decisões.

Basicamente transformamos o book de 'Relatórios Gerencial de Resultados', em que os métodos tradicionais de apuração de custos e rentabilidade eram aplicados, e que não serviam para tomar decisões, em um modelo de relatório que se norteava pelo custo variável de caixa.

Além de simplificar a elaboração dos relatórios, auxiliar na precificação, ainda não era mais necessário aguardar o fechamento mensal para conhecer o custo e o ponto de equilíbrio, visto que os rateios gerenciais não influenciam no resultado de caixa.

'Os relatórios de resultados devem responder aos questionamentos do negócio.'

Onde está o dinheiro?


Permaneci atuando com consultoria sob demanda até 2013, quando fui convidado a trabalhar com um contrato de exclusividade no interior oeste do estado de São Paulo, em Assis, no Grupo Siqueira, grupo empresarial da indústria de mineração e construção civil.

O Sr. Luiz, proprietário do grupo, é um Engenheiro Geológico, formado na Universidade Federal de Ouro Preto - UFOP e foi um dos maiores responsáveis por eu conseguir descobrir como calcular o 'ponto de equilíbrio ajustado'.

A cada reunião de apresentação de resultados em que eu lhe informava o quanto a empresa faturou e o quanto ela “deveria ter faturado” para pagar todas as contas, qual foi o custo da operação, as margens e o lucro do período, ele sempre questionava as minhas contas - "Isaias, entendi o lucro contábil, mas se eu obtive este lucro e esta margem, onde está o dinheiro?", e a cada provocação eu me desdobrava em apresentar e explicar os DFC's-Fluxos de Caixas Direto e Indireto para preencher as lacunas.

Infelizmente não foi possível finalizar o conceito no Grupo Siqueira, mas a partir destes questionamentos, no inicio de 2017 desenvolvemos nosso sistema de Controle de Resultado Disponível, onde temos as informações completas sobre o ciclo da folha de pagamentos, o ciclo de sazonalidade das vendas, o valor disponível em caixa e como premissa no relatório de resultados, a apresentação dos custos variáveis de caixa e o resultado disponível para investimento.

Graças à convivência com esses profissionais, que acabamos chegando ao nosso sistema de apuração de resultados que implantamos em nossos clientes e que responde os questionamentos do negócio.

Fica aqui então, a minha modesta homenagem ao Sr. Genésio Corrêa, ao Sr. João Bacci e ao Sr. Luiz Siqueira.

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